Depois de anos de amargura, meu padrasto me levou ao meu restaurante favorito – mas seu gesto não foi movido pelo amor.

Eu nunca recebia visitas. Então, quando Rachel bateu na porta e disse que alguém estava me esperando, eu não esperava que fosse ele – Ronnie, o padrasto que desapareceu depois que minha mãe morreu. Ele sorriu como se fôssemos família, chamou a si mesmo de “papai” e me convidou para jantar. Eu deveria ter ido embora. Mas, em vez disso, eu o segui.

As páginas do meu livro estavam embaçadas enquanto meus olhos percorriam as anotações, fórmulas e trechos sublinhados. As provas do semestre estavam chegando e eu não tinha tempo para distrações. Mas Suzy tinha outros planos.
— Você não vai acreditar — disse ela, deitada na cama, enrolando uma mecha do cabelo loiro nos dedos. — Ele realmente fez o pedido por mim. Tipo, sem nem me perguntar. Pode acreditar?
Murmurei algo sem muito interesse, os olhos ainda fixos no livro.
Suzy suspirou dramaticamente.
— Sophie, você é a pior plateia. Nem vai fingir indignação?
Sorri e finalmente levantei o olhar.
— Não sei, Suzy. Talvez ele tenha achado que você demoraria muito para decidir.
Ela gritou, pegou um travesseiro e jogou em mim.
— Mal-educada!
Desviei, rindo.
— Só estou dizendo que já te vi levar vinte minutos para escolher o sabor de um milkshake.
Antes que ela pudesse responder com um sarcasmo afiado, uma batida na porta interrompeu o momento.
Suzy arqueou uma sobrancelha.
— Esperando alguém?
Balancei a cabeça. Ninguém vinha me ver.
Rachel, uma menina do corredor, apareceu na porta.
— Sophie, tem uma visita para você.
Pisquei.
— Uma visita?
Rachel apontou com o polegar para o corredor.
— Sim. Ele está lá fora. Parece… familiar?
Meu estômago se revirou.
Confusa, me levantei e passei por ela, sentindo meu coração acelerar.
E então eu o vi.
Ronnie.
Ele estava perto da entrada, as mãos nos bolsos de uma jaqueta de couro gasta, balançando ligeiramente nos calcanhares, como se não tivesse certeza se deveria estar ali.
Seu cabelo grisalho estava penteado para trás, e seu sorriso era o mesmo que eu lembrava – fácil demais, familiar demais, ensaiado demais.
Meus pés pareceram pesar uma tonelada.
Rachel se inclinou para mim.
— Você o conhece?
Engoli em seco, minha garganta subitamente seca. Sim, eu o conhecia.
E agora, depois de todos esses anos, depois de desaparecer quando eu mais precisei… ele estava ali.
Olhei para ele, ainda tentando entender como aquele homem – o homem que sumiu da minha vida – estava de repente diante de mim, sorrindo como se tínhamos algum tipo de laço.
— Ronnie? — repeti, minha voz mais aguda desta vez. — O que você está fazendo aqui?
Seu sorriso se alargou.
— Qual é, garotinha? O que é isso de “Ronnie”? — Colocou uma mão no peito, fingindo estar magoado. — Somos família. Me chama de papai.
A palavra me causou enjoo, revirando no meu estômago como leite estragado.
Endireitei os ombros.
— Nós não somos família.
Sua expressão não mudou, mas vi um lampejo de algo em seus olhos – irritação, talvez, ou frustração.
Mas, tão rápido quanto apareceu, foi substituído pelo mesmo sorriso despreocupado.
— Continua teimosa, hein? — Ele estendeu a mão e deu um tapinha no meu ombro, como se tivesse esse direito. — Vamos colocar o papo em dia. Já faz tempo demais.
Tempo demais?
Cerrei os punhos. Ele desapareceu depois que minha mãe morreu.
Me deixou me virar sozinha, enquanto minha avó assumia a responsabilidade que deveria ter sido dele. Foi ela quem pagou por tudo – minha comida, minha escola, minha sobrevivência.
E agora ele estava ali. Agindo como se nunca tivesse me abandonado.
Respirei fundo.
— Por quê agora?
Seu sorriso não vacilou. Em vez disso, ele enfiou a mão no bolso da jaqueta e tirou um pequeno pacote embrulhado em papel de seda.
— Tenho algo para você — disse, estendendo-o.
Hesitei antes de pegar, meus dedos rígidos enquanto desembrulhava as finas camadas.
Dentro havia uma caneta rosa – daquelas com um coelhinho na ponta, as orelhas caídas, como se tivesse sido tirada de uma loja de lembrancinhas baratas.
Soltei uma risada seca, sem humor.
— Você só pode estar brincando.
Ronnie inclinou a cabeça, divertido.
— O quê?
Levantei a caneta, balançando-a levemente.
— Eu não tenho mais dez anos.
Deveria ter ido embora. Mas não fui.
Porque, por mais que eu odiasse admitir, algo naquela atenção repentina… parecia bom.
E eu queria saber o motivo real dele estar ali.
— Vamos jantar — disse Ronnie, ignorando minha reação. — Meu convite. Seu restaurante favorito. Vamos botar o papo em dia.
Cruzei os braços, estreitando os olhos.
— Meu restaurante favorito? Você sequer sabe qual é?
Ele riu.
— Claro que sei. Aquele italiano no centro. Sempre pedia lasanha e guardava metade pra depois. Sua mãe achava engraçado.
Minhas unhas cravaram na palma da mão. Ele lembrava. Parte de mim queria que estivesse errado, que estivesse inventando qualquer coisa para se aproximar. Mas ele estava certo. Era meu restaurante favorito — ou, pelo menos, tinha sido.
— E por que eu deveria aceitar esse convite? — perguntei, cruzando os braços.
Ronnie deu um passo à frente, sua expressão assumindo um ar mais sério.
— Porque eu devo isso a você, Sophie. Não posso mudar o passado, mas posso tentar compensar agora.
Compensar? Como se um jantar resolvesse anos de abandono?
Mas, contra meu melhor julgamento, aceitei.
O restaurante ainda tinha o mesmo cheiro de manjericão e alho recém-frito. As luzes amareladas criavam uma atmosfera acolhedora, quase me transportando de volta à época em que eu e minha mãe costumávamos vir aqui juntas.
Sentamos em uma mesa perto da janela. Pedi minha lasanha de sempre. Ele pediu o mesmo, como se isso de alguma forma nos conectasse.
A conversa começou superficial. Comentários sobre como eu cresci, sobre minha faculdade. Mas então, ele soltou o que parecia ser sua verdadeira intenção.
— Preciso de um favor, Sophie.
Minha espinha enrijeceu.
— Ah. Claro. É por isso que está aqui.
Ele ergueu as mãos em um gesto apaziguador.
— Não é o que parece.
— Não? Porque parece exatamente o que eu esperava. Você some por anos e reaparece do nada, fingindo querer se reconectar, mas, na verdade, precisa de algo. Então, diga logo, o que é? Dinheiro? Ajuda com alguma coisa ilegal? O que foi dessa vez?
Ele suspirou, recostando-se na cadeira.
— Tem uma herança.
Pisquei, surpresa.
— O quê?
— Sua mãe. Ela deixou um valor para você. Mas quando ela morreu, houve uma confusão com os documentos. Achei que o dinheiro tinha sido perdido, mas… — ele hesitou — … descobri recentemente que o fundo ainda existe. Só que está em seu nome. E eu… bem, eu preciso de parte dele.
Minha garganta secou.
— Você está me dizendo que sumiu por anos, nunca me ajudou com nada, e agora quer que eu te dê dinheiro?
Ele se mexeu na cadeira, desconfortável.
— Não estou pedindo tudo. Só um pouco. Estou em uma situação difícil. Preciso quitar algumas dívidas. Sophie, você não entende, esses caras—
Levantei a mão, cortando-o.
— Não me interessa. Você não tem direito a nada disso.
A expressão de Ronnie endureceu. O sorriso fácil desapareceu, revelando a verdadeira face do homem que eu sempre soube que ele era.
— Olha, garota, não seja ingrata. Eu ainda sou seu padrasto.
Soltei uma risada amarga.
— Você nunca foi meu padrasto. Foi um impostor que minha mãe amava. E eu não te devo nada.
Levantei-me, pegando minha bolsa.
— Sophie, espera. Podemos conversar sobre isso—
— Não. — Joguei algumas notas na mesa para pagar minha parte. — Acabou, Ronnie. Você não tem mais nenhum poder sobre mim.
E então saí, sem olhar para trás.
O vento frio da noite bateu no meu rosto quando pisei na calçada, mas, pela primeira vez em anos, senti que podia respirar de verdade.
Eu nunca mais olharia para trás.