HISTÓRIAS

“Moço… esse menino mora lá em casa.”

O que ela contou depois fez o milionário desmoronar.

Henrique Moreira sempre foi visto como um homem impossível de abalar. As revistas de negócios o chamavam de “o gênio das finanças”; nas palestras, era aplaudido de pé; nas fotos, posava ao lado de carrões e casas luxuosas.

Mas ninguém via o que acontecia quando a porta se fechava e o silêncio o obrigava a encarar a única falta que nenhum dinheiro resolvia: Lucas, seu único filho, desaparecido havia um ano.

Não houve bilhete, nem ligação, nenhuma pista.
Num instante, Lucas brincava perto do balanço velho no quintal… no seguinte, havia sumido como se o mundo o tivesse engolido.

Henrique gastou tudo o que tinha e o que não tinha: detetives particulares, recompensas altas, entrevistas na TV, apelos desesperados à polícia. Com o tempo, as luzes se apagaram, a imprensa perdeu o interesse, e a resposta era sempre a mesma:

— Sinto muito. Não há novidades.

Só ele continuou procurando.

Naquela manhã, vestindo o mesmo casaco amarrotado que um dia cheirara a perfume caro e agora só exalava noites sem dormir, Henrique encheu o banco do carro com cartazes de PROCURA-SE.

Dirigiu para longe dos bairros nobres.
Para lugares onde nunca havia pisado: vielas estreitas, casas simples, paredes descascadas, olhares desconfiados.

Colava mais um cartaz num poste enferrujado quando ouviu uma voz atrás de si:

— Moço… esse menino mora lá em casa.

Henrique gelou.

Virou devagar e viu uma menininha descalça, de vestido puído e olhos enormes.

— O que você disse? — sussurrou, com a voz falhando.

— Esse menino aí — apontou ela para o cartaz. — Ele mora com eu e minha mãe.

O coração de Henrique disparou.

— Tem certeza? — perguntou, sentindo as pernas fraquejarem.

A menina pegou o cartaz, examinou a foto com atenção e assentiu.

— Uhum. Ele quase não fala. Fica desenhando o dia todo.

Ela saiu correndo e voltou segundos depois com uma folha amassada nas mãos. Era um desenho simples: uma casa grande, um balanço no quintal… e um homem de mãos dadas com um menino.

Henrique não aguentou. As lágrimas vieram antes mesmo que ele percebesse. Aquele balanço… ele mesmo havia instalado no quintal de casa.

— Onde… onde ele está agora? — perguntou, com a voz embargada.

A menina apontou para o fim da rua.

— Lá. Minha mãe cuida dele.

Henrique seguiu quase sem sentir o chão sob os pés. Parou diante de uma casa humilde. Bateu na porta com mãos trêmulas.

Uma mulher cansada abriu.

— Posso ajudar?

Antes que ele dissesse qualquer coisa, Lucas apareceu atrás dela. Mais magro, cabelos bagunçados, olhos assustados… mas era ele.

— Lucas… — Henrique caiu de joelhos.

O menino o encarou por alguns segundos, confuso. Então deu um passo à frente.

— Pai…?

O abraço foi silencioso, forte, desesperado. Henrique chorou como nunca chorara na vida.

A mulher contou tudo: havia encontrado Lucas vagando sozinho, desorientado, após um acidente que lhe causara um trauma e apagara parte da memória. Não teve coragem de deixá-lo na rua. Procurou ajuda, mas sem documentos e sem saber o nome completo, acabou ficando com ele.

— Eu só tentei protegê-lo — disse ela, com os olhos marejados.

Henrique segurou as mãos dela.

— Você salvou a vida do meu filho.

Meses depois, Lucas estava de volta para casa. O balanço foi restaurado. O silêncio, quebrado. Henrique reduziu o trabalho, cancelou viagens, reaprendeu a ser pai.

E todas as semanas, sem faltar uma, ele voltava àquela casa simples — não para procurar alguém… mas para agradecer.

Porque naquele dia, numa viela esquecida, ele não apenas encontrou o filho que havia perdido.

Encontrou, também, o sentido da própria vida.

Artigos relacionados