O Segredo das Panquecas.

A manhã começou com um grito: Scooter havia desaparecido. Não havia sinal dele em lugar nenhum. Ao meio-dia, o pânico já tinha tomado conta da casa. Mas, para mim, o verdadeiro medo não era apenas ele estar desaparecido, mas com quem ele poderia estar.

Na minha casa, as manhãs raramente eram silenciosas. Eram preenchidas pelo som de passos apressados pelo corredor, o constante apitar das notificações do celular da Verônica enquanto ela atualizava seus seguidores, ou o barulho inconfundível de coisas caindo no chão — cortesia do meu gato, Bugsy, que parecia ter uma rixa pessoal com a gravidade.
Mas naquele dia, o grito cortou o ar.
— Mãe! Pai! — A voz de Mia ecoou pela casa, carregada de pânico. — O Scooter sumiu!
O murmúrio sonolento veio do quarto. Um momento depois, a porta se abriu, e Verônica apareceu, os olhos semicerrados para Mia, o rosto iluminado apenas pela luz azulada do telefone.
— Onde ele poderia ter ido? Mia, é muito cedo para suas visões espirituais.
Mia inflou as narinas, indignada.
— Fui ao quarto dele pegar água. Ele sempre tem garrafas extras para não precisar ir até a cozinha à noite. Mas ele não está lá!
Greg cambaleou para fora do quarto, ainda meio dormindo.
— Ele deve estar brincando de detetive, como sempre.
— O caderno dele ainda está lá. E ele nunca o deixa para trás.
Minhas antenas se levantaram. Greg também sentiu a tensão, porque, pela primeira vez, não discutiu. Em vez disso, veio direto até mim.
Eu estava onde sempre me encontravam — sentada na minha poltrona favorita, tomando meu primeiro café da manhã. Já estava acordada há horas, perdida em meus pensamentos.
— Eu o vi ontem à noite — falei, mexendo o café com calma. — Correndo pelos corredores.
Coloquei a xícara na mesa, fixando Greg com um olhar firme.
— A casa é segura. Ele só está escondido em algum lugar. Não vai resistir ao cheiro das panquecas.
A manhã passou. As panquecas foram feitas, o café estava quente, mas nada de Scooter. Ao meio-dia, o caos reinava. Greg vasculhava os armários como se buscasse um tesouro perdido. Mia subia e descia do sótão, murmurando sobre “energias” e “planos astrais”. Até Verônica largou o celular para espiar atrás dos móveis, como se Theo tivesse encolhido ao tamanho de uma formiga.
Eu, no entanto, saí de casa. O ar fresco me trouxe mais clareza do que qualquer xícara de café. E então eu vi. Uma pequena abertura na cerca. Quase imperceptível, a menos que você soubesse onde procurar. A mesma abertura que eu nunca consertei. Que eu deixei ali de propósito, para que Bugsy pudesse vagar pelo jardim do vizinho e pisotear suas flores perfeitamente alinhadas.
Soltei um longo suspiro. Minhas suspeitas se confirmaram.
Eu odiava visitar Harold. Ele era o vizinho insuportável, sempre com suas camisas xadrez, o barulho constante da motosserra e os produtos químicos que envenenavam o ar perto das minhas preciosas roseiras.
Entre nós, havia uma guerra silenciosa que se arrastava há anos. E agora, meu neto estava bem no território inimigo.
Lá estavam eles, na varanda. Scooter e Harold, tomando chá e comendo panquecas. Scooter, com a boca cheia, ouvia Harold com olhos arregalados.
— …e essa foi minha primeira coleção de insetos — dizia Harold, folheando um álbum antigo. — Colecionei quando era escoteiro.
— Que demais! — Scooter engoliu um pedaço de panqueca. — Você ainda coleciona?
— Claro, garoto. Mas agora, coleciono memórias.
— Scooter!
Ele se encolheu ao ouvir minha voz.
— Vovó Vivi!
— Pra casa. Agora.
Harold riu.
— Qual é, Vivi? Só estávamos tomando café da manhã.
— Ele deveria tomar café com a família, não com um… — Hesitei. — Com um estranho qualquer.
Os olhos de Harold brilharam com uma malícia que me incomodou.
— Estranho? Ah, Vivi. Não acha que já passou da hora de contar a verdade? Eles têm o direito de saber.
Scooter arregalou os olhos.
— O quê? Outro mistério?
— Theo, pra casa. Agora mesmo.
— Vivi, por quanto tempo você vai esconder isso?
Aproximando-me dele, sibilei entre os dentes.
— Nem uma palavra.
Harold apenas sorriu, tomando seu chá com a serenidade de quem sabe demais.
Arrastei meu neto de volta para casa. Eu sempre soube que esse dia chegaria, mas não esperava que fosse assim.
Quando entrei, minhas filhas já estavam reunidas. Dolly, geralmente a primeira a abraçar o drama, parecia hesitante pela primeira vez.
— Vivi, já se passaram anos. Talvez seja hora de libertar esse fardo e contar a verdade à sua família.
Margo, sempre calma, apenas serviu mais café, lançando-me um olhar por cima da xícara.
— Sim, mãe. Como exatamente devemos entender isso?
Greg entrecerrava os olhos, alternando o olhar entre Harold e eu.
— Eu também quero uma explicação. De preferência antes que eu precise de terapia.
Scooter, com o caderno em mãos, parecia pronto para anotar cada detalhe.
— Espera… Quem ele é, exatamente?
Harold se recostou na cadeira, limpou a boca com o guardanapo e, como se estivesse comentando sobre o tempo, disse:
— Eu sou seu pai.
O silêncio caiu como um peso. Mia, normalmente a mais serena, tinha o rosto pálido.
— Meu… o quê?
Harold assentiu.
— Vim jantar com meus netos. E com meu filho.
O garfo de Verônica caiu no prato. Eu sabia que o momento da verdade tinha chegado. Minhas filhas, meu filho, meu neto… todos me olhavam, esperando respostas.
Tomei fôlego, endireitei as costas e me preparei para contar a história que havia guardado durante tantos anos.
Finalmente, o segredo das panquecas seria revelado.