HISTÓRIAS

O Silêncio Que Salvou Vidas

Todo mundo gritava: — “TEM ALGUÉM AÍ?!”
Mas as crianças não respondiam.

Então, um homem de 81 anos entrou correndo no prédio. Sem falar uma palavra. Porque ele nunca falou. Nasceu mudo. E foi justamente isso que salvou quatro vidas.

Seu Waldomiro tem 81 anos. Viúvo há 9. Mora sozinho no apartamento 204, em Água Verde, Curitiba, Paraná.

Mudo de nascimento, nunca emitiu um som. Nunca disse “oi”. Nunca disse “te amo”. Nunca gritou por ajuda.
Mas aprendeu outra língua: a das mãos.

Conhece LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais) desde os seis anos. Conversava com as mãos. Vivia com as mãos. E foi com elas que salvaria quatro crianças de morrer queimadas.

No prédio vizinho, a apenas 50 metros de distância, funciona uma escola especial: o Instituto Paranaense de Cegos e Surdos. 78 alunos, a maioria com deficiência auditiva ou visual.

Era terça-feira, 15 de outubro de 2024, 3h17 da madrugada.

Waldomiro acordou com sede. Foi até a cozinha, olhou pela janela…
E viu.

Chamas laranjas no terceiro andar do prédio da escola. Fumaça preta subindo rápido. O alarme de incêndio tocando, mas ninguém saindo.

Pegou o celular e ligou para o Corpo de Bombeiros. Não conseguiu falar. Tentou digitar mensagem, mas travou de nervosismo.
Então vestiu um casaco e correu. Aos 81 anos. Sozinho. Na madrugada. Em direção ao fogo.

Quando chegou ao prédio, a fumaça já tomava o corredor do terceiro andar. A porta estava trancada. Chutou. Não abriu. Chutou de novo. Abriu.
Entrou na fumaça.

O prédio abrigava o dormitório de alunos que moravam longe. Naquela noite, 11 crianças dormiam lá. Entre 8 e 14 anos. A maioria surda.

O fogo começou por um curto-circuito na cozinha e se espalhou rapidamente. O alarme tocava alto, luzes piscavam.
Mas quatro crianças — todas surdas profundas — não ouviram nada. Estavam no quarto do fundo, dormindo, porta fechada, fumaça entrando por baixo.

Waldomiro sabia disso. Ele conhecia aquelas crianças. Elas sempre acenavam para ele da janela. Ele acenava de volta. Em LIBRAS.

— “Bom dia.”
— “Tudo bem?”
— “Até logo.”

Pequenos diálogos silenciosos que ninguém via, mas que criaram um vínculo que agora seria decisivo.

Quando entrou no corredor, a fumaça era densa. Não enxergava dois metros à frente. Abaixou-se. Rastejou. Tossiu. Mas não parou.

Chegou ao quarto do fundo. A porta estava quente. Abriu.
E viu quatro crianças dormindo, inconscientes, cercadas pela fumaça.

Ele começou a sinalizar com as mãos em LIBRAS:
— “Saiam comigo. Vamos sair.”

As crianças acordaram, assustadas. Olharam para ele, confusas, mas reconhecendo o familiar gesto silencioso. Uma a uma, ele guiou, rastejando pelo corredor, escapando das chamas.

Quando todos saíram, os bombeiros chegaram. O prédio estava tomado pelo fogo, mas graças à coragem e ao silêncio de Waldomiro, quatro vidas foram salvas naquela madrugada.

As crianças nunca esqueceram o homem mudo que falava com as mãos.
E Waldomiro, mais uma vez, mostrou que a linguagem do coração pode ser mais poderosa que qualquer grito.

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