HISTÓRIAS

“Você convida convidados para o feriado e eu continuo sendo só a cozinheira?” — protestou Luciane, franzindo a testa..

Ela puxou mais uma bandeja de carne do forno. Era início de maio, e o calor estava sufocante — a cozinha, depois de horas de forno aceso, parecia uma sauna.

Secando o suor da testa com o dorso da mão, ela olhou pela janela.
Do lado de fora, seu marido, Shelly, discutia animadamente com amigos sobre um novo modelo de quadriciclo, com uma cerveja na mão.
Risos, conversas e música preenchiam o quintal da casa de campo que tanto amavam: dois andares, quartos amplos, uma varanda charmosa e um pequeno jardim.

Não era uma mansão, mas era um salto gigantesco em relação ao pequeno apartamento onde haviam passado os três primeiros anos de casamento.
Tinham comprado o imóvel há quatro anos, hipotecado, usado todas as economias — mas finalmente tinham seu cantinho na vila, a meia hora da cidade. Um refúgio para descansar, receber amigos e viver bem.

O primeiro feriado de maio depois da mudança foi incrível.
Luciane estava radiante na cozinha, preparando quitutes para os amigos.
Shelly comandava a churrasqueira enquanto os convidados — três casais bem próximos — ajudavam com a mesa, a limpeza e até a louça.
Foi uma noite memorável: com música, dança e risadas até o amanhecer.

— “Luciane, seus petiscos são maravilhosos! Me ensina essas receitas?” — elogiou Marina, sua amiga da faculdade.
— “Cozinhar para pessoas gratas assim é um prazer”, respondeu Luciane, com um sorriso sincero.

Mas no segundo ano, tudo mudou.
Shelly passou a convidar, além dos amigos próximos, colegas de trabalho.
De repente, o número de convidados subiu para quinze.
Luciane teve que comprar ingredientes em atacado, passou o dia inteiro na cozinha: picando legumes, assando carnes, preparando lanches.

Os novos convidados agiam de forma diferente — achavam que tudo já estaria pronto, não ofereciam ajuda.
— “Luc, você é uma anfitriã nata! O Shelly tem sorte!” diziam as esposas dos colegas, enquanto devoravam os pratos.
Luciane apenas sorria.
Ela ainda gostava de receber, mas, ao fim da noite, sentia-se exausta.
Como um limão espremido.

No terceiro ano, Luciane começou a temer o feriado de maio.
Cada vez que Shelly falava sobre convidados, ela sentia o estômago apertar.
Não era aversão aos convidados.
Era o incômodo de ser invisível.

A lista de convidados cresceu para mais de vinte. E, entre eles, o novo gerente de Shelly — alguém que ele queria impressionar.

— “Amor, vamos manter tudo simples esse ano”, disse Shelly distraidamente, rolando o feed no celular.
— “Só um churrasco e os seus acompanhamentos de sempre. Nada sofisticado.”

E lá estava Luciane de novo, suando sobre o fogão quente.
Sem ajuda. Sem reconhecimento. Apenas um ou outro comentário genérico.

Ao sair para a varanda com uma bandeja de folhados, alguém bateu palmas.
Ela se assustou e olhou.

Era Layla, amiga de um amigo.
— “Você que fez tudo isso? Meu Deus. Você é uma máquina!”
Luciane sorriu, cansada, os braços doendo. — “Obrigada.”
Estava prestes a voltar para dentro, quando Layla segurou seu braço com delicadeza.

— “Sabe… se você começasse um serviço de catering, eu seria sua primeira cliente.”

Luciane arregalou os olhos. — “Catering?”

— “Sim! Isso aqui tem nível de restaurante. Sério mesmo.”

Aquele simples comentário ficou ecoando na mente dela pelo resto do dia.

Mais tarde, depois que os convidados se foram e Shelly adormeceu na frente da TV, Luciane continuava acordada.
Pegou o celular e digitou: “Como abrir um negócio de catering em casa”.

No quarto ano, tudo era diferente.
Mas não da forma que todos esperavam.

Luciane não cozinhou naquele ano.
Pelo menos, não para a festa de Shelly.

— “Amor, já contei a todo mundo que você vai preparar seus espetinhos de cordeiro”, disse ele, sorrindo, em abril.

Luciane respondeu com serenidade:
— “Sinto muito. Já tenho compromissos nesse final de semana.”

— “Compromissos? Como assim?”

— “Dois pedidos grandes de brunch para o Dia das Mães.”
Ela dobrava um pano com movimentos calmos.

— “Pedidos? Que pedidos?”

Ela se virou.
— “Comecei a fazer catering. Coisas pequenas, por enquanto. A Layla me ajudou a divulgar. Criei até uma página no Facebook.”

Shelly ficou confuso.
— “E a festa?”

— “Você pode cozinhar ou encomendar. Eu vou trabalhar.”

Ele bufou.
— “Você não pode cancelar uma tradição!”

Luciane deu de ombros.
— “Eu não cancelei. Quem fez isso foi você — no dia em que deixou de me tratar como parceira e passou a me usar como mão de obra gratuita.”

Não falou com raiva.
Falou com verdade.

Shelly não respondeu.
E no dia da festa, o quintal ainda estava cheio de gente e som.
Mas desta vez, as mesas estavam cobertas com comida de supermercado.
Talheres de plástico. Refrigerantes.

Luciane passou o dia na cozinha da associação da vila, que havia alugado.
Seus doces, mini sanduíches e copinhos de mousse de morango sumiram em minutos.

Ela recebeu cinco novos pedidos naquele dia.
Uma mulher até perguntou se ela poderia atender a um casamento pequeno.

Quando voltou para casa, a festa já havia terminado.
Shelly estava sentado no sofá, com uma cerveja pela metade.
Não disse uma palavra quando ela entrou. Apenas a olhou — com uma mistura de orgulho e confusão.

No quinto ano, Luciane tinha uma pequena equipe.
Seus fins de semana estavam cheios de eventos — aniversários, casamentos intimistas, almoços corporativos.
Seus seguidores nas redes sociais cresceram, e os clientes adoravam seu toque artesanal e acolhedor.

Ela e Shelly ainda moravam na mesma casa.
Mas agora, Luciane tinha sua própria cozinha-estúdio no antigo espaço da garagem, recém-reformada — e só dela.

O casamento deles? Mudou.
Precisava mudar.

Discutiram.
Depois conversaram mais.
Com o tempo, Shelly começou a ajudar nos finais de semana — lavando bandejas, organizando ingredientes.

Ele ainda fazia uma pequena comemoração em maio.
Mas agora, mais simples.
Com amigos próximos.
Comida básica.
Às vezes, ele mesmo cuidava da churrasqueira.

E Luciane?

Ela voltou a amar o mês de maio.
Não pelas festas.
Mas porque se reconectou com ela mesma.

Ela não cozinhava mais por obrigação.
Cozinhava com propósito.


Lição de vida?
Às vezes, damos tanto de nós que esquecemos de guardar um pouco para nós mesmos.
É fácil se perder em papéis — “a cozinheira”, “a ajudante”, “a esposa” — até esquecermos quem somos de verdade.

Mas podemos dizer não.
Podemos crescer.
Mudar.
Sonhar novos sonhos — mesmo que isso incomode algumas pessoas no começo.

Luciane não queimou pontes.
Ela apenas construiu um novo caminho.

E agora, ela caminha por ele — com confiança, alegria
e um coração cheio de sabor. 🍓✨

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