HISTÓRIAS

O Plantão da Madrugada

Ele apertou a campainha do hospital várias vezes.

Era madrugada.
O corredor estava mergulhado em silêncio, quebrado apenas pelo bip constante dos aparelhos. A dor vinha em ondas — forte, crua, daquelas que fazem a fé vacilar por alguns segundos.

Ele estava sozinho.
Sem visitas.
Sem família.
Sem ninguém.

Apertou a campainha mais uma vez.
Nada.

Tentou de novo, já com a mão trêmula.
Nada.

O desespero começou a se misturar ao medo. A dor parecia crescer, e a sensação de abandono pesava mais do que o próprio sofrimento físico. Quando já pensava em desistir, a porta do quarto se abriu devagar.

Entrou uma enfermeira.

Ela se movia com uma calma estranha para aquele horário. O rosto era sereno, o olhar profundo. O uniforme chamava atenção: simples, antigo, como se fosse de outra época.

Ela não se apresentou.
Não perguntou seu nome.
Não questionou a dor.

Apenas sorriu.

Com gestos delicados, ajustou o travesseiro, passou a mão em sua testa e aplicou um remédio que ele nem chegou a ver de onde veio. Em seguida, começou a cantar.

Era uma melodia baixa, suave, quase como uma prece.
Aos poucos, a dor foi diminuindo.
O corpo relaxou.
O medo desapareceu.

Antes de sair, ela se aproximou e disse em voz firme e acolhedora:

— Descanse. Você não está sozinho.

A porta se fechou silenciosamente.

Quando o sol nasceu, ele acordou diferente.
Sem dor.
Com uma paz que não sentia há muito tempo.

Assim que a equipe médica entrou para a troca de plantão, ele agradeceu emocionado:

— Obrigado pela enfermeira que cuidou de mim de madrugada.

O chefe da enfermagem franziu a testa.

— Que enfermeira?

— A que esteve aqui… ajustou meu travesseiro, me medicou, cantou para mim.

O ambiente ficou em silêncio.

Curiosos e inquietos, foram até a sala das câmeras de segurança. Revisaram o horário exato da madrugada.

O quarto estava vazio.

Nenhuma pessoa entrou.
Nenhum crachá foi registrado.
Nenhuma porta se abriu.

Apenas… uma luz branca suave apareceu no quarto por alguns minutos…
e depois se foi.

O médico respirou fundo e disse em tom baixo:

— Existem cuidados que não estão nos prontuários.

Alguns dizem que foi alguém da Falange de Maria.
Outros acreditam que fazia parte da equipe espiritual do Dr. Bezerra de Menezes.

Mas uma coisa é certa:

Nem todo cuidado vem com crachá.
Nem toda cura vem da Terra.

E, nas madrugadas mais solitárias…
o céu também faz plantão.

Artigos relacionados